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Camilo Castelo Branco é mais conhecido por ter escrito novelas do que por ter escrito teatro. Mas, em 1860, foi representada, no Teatro D. Maria II, uma peça de sua autoria, que alcançou grande sucesso. Chamou-se O Morgado de Fafe em Lisboa. É provável que este sucesso tenha determinado a escrita de segunda peça com o mesmo protagonista, levada à cena, também no D. Maria II, em 1863. Esta segunda peça, que se chamou O Morgado de Fafe Amoroso, causou, no entanto, grande escândalo, e Camilo Castelo Branco foi então acusado de imoralidade.

Lendo a peça, publicada em 1865, não se encontram, porém, razões para o escândalo nem para a acusação. Nada parece haver ali de escandaloso. De algo parecido se queixava Júlio César Machado num jornal da época, quando dizia ter ido ao D. Maria II esperando assistir a uma peça cheia de malícias, e não ter afinal encontrado mais que uma comédia honesta e pudica. Devemos a este cronista a explicação: após a primeira representação, Camilo emendou a peça, para excisão do que tanto chocou o público. Mas nem Júlio César Machado nem ninguém chega nunca a informar sobre o que cortou o escritor da peça, sobre o que tanto escandalizou  público. E o texto publicado em 1865 é o texto da peça emendada por Camilo, não o texto escandaloso, que nunca encontrou caminho até nós.

Na investigação feita para a edição crítica das duas peças, que a Imprensa Nacional acaba de publicar, julgo ter achado a resposta para a pergunta que fica desta história, e identificado o local da peça onde o escritor fez o corte e transformação, necessários ao perdão do público. Camilo Castelo Branco usou, na peça O Morgado de Fafe Amoroso, personagens, situações e mesmo texto de uma novela que escrevera, anos antes, sob pseudónimo. A descoberta desta origem e do reaproveitamento da novela na peça permite compreender não só alguns dos processos de escrita de Camilo Castelo Branco, mas também talvez, justamente, as razões do escândalo de que só nos chegaram os ecos.

Pertence à coleção Edição Crítica de Camilo Castelo Branco, dirigida por Ivo Castro, o volume O Morgado de Fafe, que inclui as duas peças com este protagonista, além da Nota Editorial, com pormenores sobre a referida investigação, e da edição do artigo de Júlio César Machado publicado então no jornal Revolução de Setembro. A edição crítica das peças foi preparada por Patrícia Franco, Mafalda Pereira e por mim própria.

Ângela Correia

Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa

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