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Odeio quando as pessoas não deixam as coisas como elas estavam. Há uma razão para estarem naquele preciso lugar e não noutro qualquer. Há uma dinâmica, uma estética, uma facilidade de acesso… enfim, uma miríade de razões que não interessa agora enumerar por completo.

Por exemplo, quando a porta está completamente encostada é porque há uma razão para tal. Não é para entrar ou sair e deixá-la escancarada, ou mesmo meio aberta ou quase encostada. Porque todos os sons incomodam, desestabilizam a concentração, deitam por terra o raciocínio sólido, cortam a linha de pensamento. Fora de brincadeiras: faz toda a diferença, mas ninguém me leva a sério. Até há quem me chame picuinhas. Por amor da santa!

Picuinhas são aqueles que não conseguem dormir com relógios a funcionar no quarto, até mesmo os de pulso que mal se ouvem. Eu não sou deste tipo de pessoas. Já fui, quando era mais nova, mas deixei-me disso. Até acho relaxante e durmo com mais de cinco a criar uma sinfonia de tiquetaques, cada um seguindo o seu próprio ritmo.

A minha tia é deste tipo de pessoas, que até um relógio de pulso enfia na gaveta, entre a roupa, para abafar o som. No entanto, não a acho nada picuinhas. Ela consegue dormir com uns quatro ou cinco gatos na cama! Parece tudo muito bonito e fofinho, mas não é, que eu bem sei! Com um gato, tudo bem. Faz companhia, aquece (não tanto quanto um cão mais grandito) e é fofinho, sim senhora! Contudo, quando começa a exceder, tanto em número como em quilogramas… ui! Então a história é outra.

Chega uma altura em que já nem dá para nos mexermos, e acordamos desconfortados. E empurramos os gatos? Claro que não – às vezes nem há força para tal, seja pelos tais quilitos a mais, seja pelas horas de sono a menos. Coitadinhos! Não queremos acordá-los e até achamos querido. Por isso, aguentamos nós o desconforto, mesmo tendo consciência de que, muito provavelmente, o gato nem se importaria de ser encostado para o lado. Falo por experiência, está claro. Compreendo bem a minha tia.

No entanto, não lhe digo nada, nem tenho nada que dizer! Cada um sabe de si. E eu sei tanto de mim que não suporto quando alguém pensa que sabe mais do que eu. A minha tia é a minha tia. Eu sou eu. Eu sei coisas que mais ninguém sabe sobre mim, como, por exemplo, o que me passa pela cabeça. Quando, um dia, alguém descobrir como aceder aos meus devaneios mais secretos, pode ser que deixe tal pessoa fazer como bem entender. Até lá, ponham-se a milhas!

Ana Rita Sintra

Os Invulgares

One Comment

    • José Serra

    • há 5 anos

    Linha de raciocínio imaginativa e interessante. E não admito que alguém possa conceber a análise de maneira diferente. Há coisas que são por si próprias, sem necessidade de interpretação. Picuinhice seria estar a tentar descortinar outras classificações que não fossem as que aponto e defino. Mas que há picuinhas, há!!!

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